A Mulher que venceu o câncer e fez dele seu trabalho



por Caroline Corrêa

Ao pegar o primeiro sutiã pós-cirúrgico, Valéria Cândido Marcondes, de 49 anos, se surpreendeu, não conseguiu esconder o desapontamento e a insegurança que teve ao segurar a peça. Desabou de chorar, pois um simples sutiã representava uma nova vida, uma nova etapa. A mulher sorridente e de semblante leve, enfrentou dois cânceres; diagnosticada em 2006 com melanoma, que começou com uma pintinha de nascença e resultou em câncer de pele. Já em 2012, seu diagnostico foi câncer de mama, com um nódulo difícil de ser encontrado e já num estágio avançado, mas venceu ambos e então começou a enxergar a vida de outra maneira e, por isso, resolveu mudar a vivência de outras mulheres que já enfrentaram ou ainda enfrentam o câncer de mama: “eu queria dar um apoio, uma mão amiga para mulheres que passam pela mesma situação que já passei”, comenta. Foi quando a associação Fraterna Mão Amiga nasceu.



Com uma infância tranquila, cheia de liberdades e brincadeiras, Valéria nunca imaginou que passaria por tudo o que passou. Casou-se aos 18 anos, depois de ter enfrentado a pressão dos pais. Tinha planos totalmente diferentes para o futuro, ficou grávida aos 20 do primeiro filho: “Sempre dizia para Ricardo, meu marido, que deveríamos construir nossas vidas para depois termos filhos”. Tornou-se mãe de cinco filhos, quatro meninos e uma menina. O olhar é de mãe coruja que vive para dar amor e carinho aos filhos. Quando falou sobre a primeira luta contra o câncer, Valéria se recorda da preocupação que teve com os filhos, principalmente com a caçula: “A Sara era muito pequena, então era muito complicado. Foi como um susto”. O apoio familiar foi maravilhoso e gratificante, ainda mais quanto à perda dos cabelos começou na radioterapia quando enfrentava o segundo câncer: “Todos em casa ficamos carecas”, se lembra sorridente. “As pessoas vinham me visitar e a Sara corria para o portão para avisar que eu estava careca e que não era para se assustar”, se recorda de um acontecimento que parece ter sido há décadas atrás. “Muitas pessoas ainda tem preconceito, estão desinformadas, acreditam que câncer é uma doença transmissível”, Valéria lamenta amigos que a rejeitaram.

Mas a vida é aeroporto cheio de chegadas e partidas. Muitos amigos se perderam no caminho, mas a doença trouxe muitas novas amizades. A Associação Mão Amiga tinha essa finalidade. E tudo começou com o sutiã pós-cirúrgico. Valéria ainda era uma mulher, queria usar um sutiã bonito ou um maiô na praia, que agora precisavam ser preenchidos por uma prótese de silicone, devido à cirurgia de retirada da mama esquerda: “Imagina o quão complicado é para alguém que amamentou cinco filhos se encarar”, uma longa pausa repleta de silêncio toma conta da sala. “Usar uma prótese dentro de um sutiã básico era uma situação difícil, era algo que mexia com a minha cabeça, pois até então, eu não me olhava no espelho”, diz. Foi então que ela resolveu buscar lugares onde fizessem lingeries para mulheres que enfrentaram um câncer. A Fraternidade Mão Amiga de Taubaté busca ajudar mulheres a aumentar a autoestima e se amar.

A associação ganhou apoio de diversos artistas, como Lucas Lucco, Daniel, Padre Antônio Maria, Daiane dos Santos, Príncipe Dom Bertrand e outros; que de alguma forma fizeram doações para arrecadar dinheiro e contribuir com tantas mulheres que buscam em Valéria um apoio, tanto emocional quando de doações de lingeries e próteses: “Infelizmente, eu ainda não consegui um lugar hospedar a associação”, e completa dizendo: “Minha casa é muito apertada para fazer bingos ou rifas para a associação”. Um de seus sonhos é ter um cantinho para chamar de Lar da Fraterna Mão Amiga de Taubaté.

Após toda sua luta, Valéria segue firme levando suas vivências e exemplo a outras mulheres. Hoje ela é palestrante e sempre está presente em ONGs e Institutos para mostrar que a luta é mais forte. Em julho de 2016, a emoção tomou conta de seu ser; foi condutora da tocha olímpica em Taubaté. Tudo começou com o incentivo dos filhos para se inscrever para ser uma das representantes desse momento tão importante no país: “Eles me diziam que não custava tentar e começaram a escrever a história para os três patrocinadores desse momento e então fui escolhida pela Nissan”, sorri, enquanto mostra orgulhosa a replica da Tocha que ganhou. “Eu não imaginava que poderia ganhar, pois muitos brasileiros enviariam suas histórias”, completa.

Em seus olhos é perceptível o desejo de viver a vida como se o amanhã não existisse: “Pulei carnaval pouco tempo depois de tirar todos os drenos. E olha que nem sou chegada nessa época. Coloquei uma peruca nega maluca e fui atrás do Juca Teles”. Enche-se de orgulho de si mesma: “Uma coisa que sempre digo nas palestras é que deve se valorizar a si mesmo, independente de como você esteja”. A luta contra o câncer é muito dura para se entregar: “Você não pode enxergar uma pessoa que enfrenta o câncer como coitada, ela é guerreira”, diz. Valéria lembra-se de quão guerreira e perseverante ainda é.