Vovó Laine, um recorte de sabedoria para a posterioridade



por André Guidoni

De nome pequeno, mas de grande coração, Gislaine Nunes de 48 anos, já é avó de dois mocinhos, o Davi de um ano e o Gabriel de onze, tão pequenos que mal sabem que a Vovó Laine, que curte tanto esse apelido dado por eles, é uma mulher que soube fazer de sua vida um palco para mostrar sua importância à sociedade e sua força para superar grandes turbulências do passado.



Gislaine trabalha com limpeza, sabe? Limpeza! Ela me falou que você poderia até parar de ler esse texto, porque sabe que infelizmente as pessoas enxergam os funcionários do serviço da limpeza como transparentes, chegamos a discutir sobre essa discriminação tão impetuosa e a resposta que ela deu é muito clara “se pensam que se é alguém da limpeza a pessoa não pensa, a pessoa é burra, a pessoa é atrasada, avisem que não tem nada disso! Existem muitas pessoas nesse trabalho que tem muito conteúdo”. E é verdade, ela é prova disso. Em seu atual trabalho, em uma startup educacional de São José dos Campos, onde tivemos a oportunidade de conversar com Gi por uma hora, o cenário é outro e totalmente otimista, pois o ambiente além de ser acolhedor existe a igualdade nas relações. Ela revela que todas as pessoas da empresa têm um cuidado especial e interagem com seu jeito falastrão e brincalhão de ser, além disso o normal aqui acontece, todos da empresa, independente da posição, saem juntos para as campanhas externas e comemorações de resultados, afinal todos integram um grande time.

Não é esse o único time que a Gi faz parte, afinal, ela começou a montar o seu bem cedo, com 17 anos ficou grávida de seu primeiro amor, sempre amiga de uma boa balada na adolescência, foi se apaixonar por um rapaz que era praticamente o sósia do Michael Jackson, ainda moreno, com quem teve sua primeira filha, que hoje tem 30 anos e trabalha com administração. Ela revela que naquela época as pessoas não gostavam de falar sobre sexualidade abertamente e quando alguém descobria que alguma garota havia tido relação sexual com algum menino era a maior fofoca e o pessoal caia em cima, agora imagina com ela que ficou grávida “virei a própria bruxa, só faltaram me queimar”, o pior é que ela teimava dizendo que não estava grávida, até chegou a discutir com a cunhada da época por isso. Toda garota que acaba engravidando cedo acaba tendo algumas consequências, cicatrizes que são difíceis de sumir, com a Vó Laine não foi diferente, ficou sozinha, teve que abandonar os estudos e começar a trabalhar em um escritório, mas percebeu que com o passar do tempo as opções ficaram escassas, pois não fez o Ensino Médio. Ela desabafa dizendo que “ficou difícil, porque eu não estudava, não fazia nenhum curso e não estavam mais aceitando uma pessoa que não tivesse estudo”, por mais que não tivesse estudo, Gi sempre conseguiu emprego em lugares relacionados à educação, trabalhou no CIEE, uma escola dentro do CTA e no Quero Bolsa.

Percebi que ela divagou quando pensava nos lugares que trabalhou e que remetem a educação, com isso faço uma pergunta que já tinha resposta evidente: qual é o seu maior sonho? “Um sonho que tenho é terminar meus estudos, sonho de vida, mas acabou sendo cancelado por certas situações em minha vida, várias situações”. Uma dessas situações aconteceu há quatro anos atrás, Gi nos contou que sua mãe ficou muito doente e teve que abandonar o trabalho CTA para cuidar dela “chorei pra caramba, porque precisava muito do trabalho, mas eu precisava muito mais da minha mãe viva”, acabou que esse sonho acaba sempre atrasado, mas com perspectivas de um dia ser realizado.

Em nossa conversa ela se referiu muito a duas pessoas: mamãe e papai, as quais, ela tem profundo respeito e amor, exalando esse carinho ao sempre chamar os dois dessa forma. Gi conta que em sua infância, morou com os pais e os irmãos em um apartamento luxuoso, o pai era Budista e chegou a ter uma empresa que prestava serviços para Petrobrás e sua mãe era aposentada pela Tecelagem Parahyba. Ambos batalharam muito para conquistar uma boa qualidade de vida juntos, mas enfrentaram problemas que colocaram todos os feitos a perder.

Depois de estar mais confortável, Gi, conta o episódio que deu uma grande reviravolta em sua vida “meu pai tinha um cargo na religião budista e várias reuniões eram feitas em casa e ele acabou se engraçando com uma das moças que iam nas reuniões, que era casada e tinha um casal de filhos” basicamente ele foi trocando Aparecida, mãe da Gi, por essa mulher 20 anos mais jovem que frequentava a casa da família Nunes. O que a amante não esperava é que ela é um pouco esquentada “a minha mãe é insana, arrebentou ela, mamãe não era uma mulher de falar não, ela chegava e já resolvia o problema”. Parece que a mãe da Gi até descobriu que a amante já havia largado o marido e vivia de uma pensão que o pai dela dava a amante. Resultado: Aparecida não queria ver seu marido nem pintado de ouro e teve que começar a trabalhar com os filhos, já o ex-marido, pai da Gi, começou a passar por problemas financeiros e a amante achando que ia ter a maior vida boa, acabou dispensando ele na falta de dinheiro e falando “lugar de velho é no asilo”.

Mas a vida recompensa, hoje Gislaine Nunes pode afirmar que tem uma vida bem melhor e que sabe aproveitar cada momento de felicidade, casou-se com um amigo de sua filha mais velha há alguns anos, decidiu ficar com sua mãe Aparecida nos últimos momentos e sabe que só encontramos ajuda com pessoas que jamais iríamos contar, a humildade é algo que preza e que leva junto com seu orgulho de ser brasileira.