Evelyn Lopes, aluna do ensino médio da rede pública no Vale do Paraíba, é exemplo de empoderamento e resistência Aos 17 anos, Evelyn é assumidamente feminista. Apesar do baixo tom de voz, a segurança em sua fala deixa à mostra o tamanho de sua maturidade e isso permite que ela tenha propriedade quando o assunto é feminismo, racismo e preconceito.
Por Natalia Souza
Negra e de origem humilde, estudou por muito tempo em uma escola particular católica em Taubaté (SP), com bolsa de estudos. Foi lá que teve os primeiros contatos com o preconceito. Além do racismo na infância, ela recorda do abuso que sofreu e de ter presenciado dois divórcios da mãe. Mesmo assim, Evelyn se tornou uma pessoa forte graças à mãe, que sempre a incentivou e reforçou sua capacidade.
Tudo isso fez com que Evelyn procurasse por respostas para suas dúvidas internas, mas descobriu que havia outras mulheres com o mesmo propósito. Procurou lugares e companheiras que pudesse se inspirar e compartilhar da mesma luta, já que no espaço escolar ainda é muito difícil discutir questões sociais. Em entrevista, ela conta como tem sido essa descoberta sobre o feminismo.
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| Evelyn participa de rodas de conversa sobre assuntos sociais. |
Depois dessas experiências, como você se relaciona consigo mesma?
Eu acho que muito graças ao feminismo e até mesmo ao feminismo negro que vem resgatar e dar essa autoconfiança para as meninas. Por todo o processo histórico dos negros, toda nossa cultura foi demonizada, nos somos demonizados! As mulheres são objetificadas também. Então, isso tem muito reflexo para nós, parece que a mulher negra ainda é objeto de entretenimento sexual. Assim como o exemplo da globeleza, total entretenimento para os homens. Uma mulher negra que esta totalmente exposta.
Quando você descobriu o que era o feminismo?
Então, que bom que a gente muda e pode mudar as ideias. Acabei descobrindo o feminismo por um trabalho de sociologia que a gente tinha que fazer. Engraçado que eu fui pegar um caderno meu do 9º ano para rever umas matérias e acabei vendo umas redações minhas em que eu já falava sobre desigualdade e essas coisas. Então acho que eu era feminista e não sabia.
Se assumir feminista negra, mudou a forma das pessoas se relacionarem com você?
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| Cabelos sempre com turbantes, tranças ou black. |
Depois que a gente se assume e começa a fazer ações afirmativas na vida, muda muita coisa, porque algumas pessoas começam a ficar esquivando de você. Outras, você tem novas amizades, conhece novas pessoas e agrega mais experiências. Mesmo dentro do feminismo negro a gente tem essa pauta de falar da solidão da mulher negra. Não só dos relacionamentos, mas da ocupação do espaço também. Ser mulher feminista já é uma grande afronta e o feminismo negro ainda é muito mais. Porque além da gente sofrer as questões de gênero, também tem o racismo. São duas coisas juntas, uma luta a mais.
Você falou da solidão dos negros em si. Onde você encontrou um grupo que possa partilhar hoje das mesmas ideias e discutir os mesmos problemas?
Então, acho que eu tive sorte de fazer amigos no ensino médio que a maioria das meninas que eu conheço são todas feministas. Para mim foi mais fácil identificar as coisas, tem meninas negras lá que ainda reproduzem o feminismo que é branco. Não é querer fazer divisão, mas tem pautas do feminismo branco que eu tenho que julgar se se aplica a mim.
Quais meios você usa para se atualizar, pesquisar e estudar?
Eu uso a internet praticamente. Sempre estou vendo arquivos do Guéledes, que é o Instituto da Mulher Negra. Também tem um canal do Youtube que se chama ‘Afros e Afins’, que é da Nataly Neri e os vídeos são muito bons. Eu estou sempre buscando artigos e documentários. Tem um que assisti recentemente, o nome é 'A décima terceira emenda'.
Isso te fez querer entrar para o Youtube?
O Youtube é uma plataforma incrível que você pode divulgar ideias e passar conhecimento. Era conhecimento que eu achava que era muito para mim sabe, o Youtube só é uma forma de eu colocar isso, porque eu também quero acrescentar nessa luta.
Você tem planos para o canal?
Eu tenho! Quero que meu canal seja diversificado, plural. Quero fazer um período com a temática do feminismo, vertentes falando do feminismo negro, do movimento negro, que é muito importante, e também quero chamar pessoas pra fazer vídeos sobre diversidade de gênero, falar sobre sexualidade, conscientizar mesmo. Minha principal ideia é tentar abrir a cabeça das pessoas pra que a gente consiga caminhar e aos poucos fazer um mundo melhor para todos.
Você está no terceiro ano do ensino médio, reta final. Você já pensa em alguma profissão?
Desde os 7 anos, é ter uma ONG em comunidades carentes que possa trazer outra realidade para essas crianças, usar o esporte como meio de socialização. Eu acredito muito que cada pessoa tem um pouquinho para dar para o mundo. Uma ONG que traga o esporte e que tenha também uma escola funcional para ajudar a pessoa a se encontrar, ser um adulto que faça diferença no mundo e que ninguém seja desrespeitado e discriminado. Ano que vem, caso eu passe na faculdade, vou fazer Educação Física e penso em fazer também Ciências Sociais ou Serviço Social. Depois um técnico de administração de empresas pra saber lidar com a ONG e somar.

