Jovem fala sobre os desafios de ser cadeirante

Aos 17 anos Talita de Lima tornou-se deficiente física e precisou adaptar-se a nova condição para não desistir de seus sonhos

Dona de uma maturidade notável, Talita de Lima, de 18 anos, tornou-se cadeirante há um ano, quando descobriu ter uma doença autoimune chamada neuro mielite óptica. Mas, mesmo com os obstáculos diários, a estudante do curso de letras da Universidade de Taubaté, vem driblando as dificuldades com a ajuda dos pais.

Por Pâmela Mello
Talita de Lima passou no vestibular da
Universidade de Taubaté e
ingressou no curso de letras em 2014

Filha única, de aparência frágil, Talita surpreende, mostrando-se muito forte ao falar sobre todo processo de adaptação à nova condição e impacto sofrido por conta o prognostico indefinido da doença.

Apesar dos médicos não afirmarem nada, positivo ou negativo, em relação a possível recuperação da Jovem, sem deixar-se abater pela incerteza, Talita segue esperançosa, mesmo sem a certeza de um dia voltar, ou não, a andar.

Atualmente a universitária lida naturalmente com as condições imposta por seu corpo, vivenciando sua juventude quase que como outra garota qualquer. Talita estuda, faz estágio, namora, sai com os amigos, viaja e ainda arruma tempo para lançar-se ao empreendedorismo e investir em seu novo negócio: Brigadeiros.

Em entrevista, a universitária expõe seu ponto de vista quanto à exclusão dos deficientes físicos, baseado na experiência vivenciada pela própria.

Como foi o processo de se tornar cadeirante?

Talita de Lima - Foi algo repentino. O primeiro sintoma surgiu em novembro de 2013, começou com dormências nas pernas, subindo até o abdômen e acabou atrofiando uma das minhas mãos. Já no hospital, descobrimos a lesão medular, mas os médicos não fecharam o diagnóstico. Fiquei quase um ano sem descobrir o que eu realmente tinha. Os sintomas do primeiro surto sumiram completamente em fevereiro de 2014, mas no final de julho eles voltaram, e dessa vez pro meu azar contrai catapora, o que fez o meu corpo produzir muitos anticorpos e aí veio a paralisia. Dia 5 de setembro eu fui ao hospital às 14 horas, com muita dor na lombar, febre, vômito e fraqueza nas pernas. Me internaram. Às 18 horas eu acordei sem mexer as pernas.

Como você lidou com a situação inicialmente e como lida com atualmente?

Eco terapia tem feito parte do cotidiano de Talita,
que não perde a esperança de voltar a andar
Talita de Lima - No primeiro momento o choque foi tão grande que eu não expressei muitos sentimentos. Lidei como se fosse uma dorzinha de estomago e que em uma semana eu estaria ótima. Com o tempo eu fui percebendo que não iria passar, que essa doença faz parte da minha vida e que eu precisava aceita-la. Eu acredito que só se pode resolver uma situação quando você toma distância e percebe, de todos os pontos, qual é essa situação e se aceita ou não. É claro que do momento em que eu percebi a minha condição, até o momento de aceitação, eu sofri muito. Houve o período de negação, de sofrimento, de dor, de questionamento e muita revolta. Esse momento também é importante, ele também precisa ser vivido. Toda vez que algo ruim acontece na nossa vida, esse algo precisa ser encarado como ele é antes de ser resolvido. Quando algo bom acontece ficamos hiper felizes e quando algo ruim acontece, temos o direito e até dever de nos permitir sofrer...até certo ponto. Todo esse amadurecimento eu devo muito a minha namorada Priscila, que foi a pessoa que mais conviveu com minha dor de perto e teve uma sabedoria extraordinária pra lidar com toda essa situação. Mas não é todo mundo que tem alguém e chega uma fase da vida que precisamos de um auxilio profissional, foi quando eu realmente decidi frequentar uma psicóloga Essa combinação de apoio e carinho me fizeram a pessoa que sou hoje.

Quais os principais desafios em ser cadeirante?

Talita de Lima - Existem desafios. O primeiro é o interno: o de se olhar no espelho e ver que seucorpo mudou, ver um acessório que quase faz parte do seu ser mas que aquilo não é você. O maior desafio interno é se conhecer novamente, conhecer seus limites,suas vontades. Eu não sou uma mulher cadeirante. Eu sou mulher e soucadeirante. E essa diferenciação foi um grande desafio. O outro é o desafio externo: lidar com o olhar das pessoas. Em um primeiro momento, no qual eu ainda estava fragilizada, foi muito difícil responder as perguntas das quais eu ainda não sabia direito a resposta, perguntas que eu não estava habituada a responder e aqueles olhares, olhares curiosos. Não tem problema nenhum em ser curioso, eu sou curiosa a tudo o que me é diferente e isso é bom. Quem precisava aprender a lidar com isso era eu e eu aprendi. Outro desafio, é que as pessoas não tem muita noção de como lidar com os cadeirante também, elas querem ajudar mas não sabem como, querem ter atitudes mas não sabem como e outras não percebem que precisam tomar certas atitudes quando um cadeirante está no local. E eu me pergunto por que isso acontece. Eu saio nas ruas e não vejo pessoas como eu. Porque eu não vejo? Elas existem! E esse tem sido meu atual desafio que ainda não foi superado, o desafio da inclusão.

O cadeirante sofre exclusão social?

Talita de Lima - Sim, talvez não propositalmente, mas as cidades, os ambientes sociais e até mesmo ambientes de trabalho e estudo, em sua maioria, não são arquitetados de formas acessíveis. As pessoas acabam perdendo o contato com esse outro tipo de realidade e quando vêm um cadeirante em um ambiente surge estranheza, curiosidade.

Como é a locomoção de cadeirantes em Taubaté?

Talita de Lima - Na cidade de Taubaté, se você é cadeirante e não tem um amigo habilitado, habilitação e carro ou dinheiro pra taxi, você não sai de casa. Existe alguns ônibus adaptados, mas eu só consigo usa-los se eu estiver acompanhada, sozinha eu não chego nem no ponto de ônibus.

Como é sua vida social e quais são seus hobbies?

Talita de Lima - A minha vida social é extremamente ativa, eu namoro, sou cercada de amigos, saio todos os finais de semana, viajo e faço tudo que sinto vontade. Eu gosto muito de ler e assistir filme, gosto de sair pra comer com meus amigos e minha namorada.

Quais são seus planos futuros?

Talita de Lima - Meu plano mais próximo e viável no momento é a CNH, apesar de ser um valor alto pro meu orçamento, tenho guardado dinheiro e acredito que esse é um passo a mais pra minha independência. Fora esse plano, estou trabalhando para conseguir terminar a faculdade.