A filosofia de vida ensinada em uma arte marcial

Como um estilo de luta originalmente militar, o Karatê incentiva fazer o bem, além de impor respeito e disciplina Nascido em agosto de 1964, na cidade de Santos (SP), Marcos Alberto Fortes sempre foi o aluno que tomava a liderança nos trabalhos de escola.
Por Danyel Rezende



Seminários sobre o Karatê são feitos aos
alunos novos todos os anos pelo professor Marcos

A vontade de ser útil, de estar à frente e de ajudar àqueles que têm dificuldade já o moviam desde criança. 
E foi com essa característica nobre que Marcos se tornou pós-graduado em treinamento desportivo e personalizado pelo Faculdade de Educação Física de Santos, a FEFIS. Ainda criança, os primeiros filmes do Bruce Lee despertaram a paixão dele pelas artes marciais, fascinado pelos movimentos feitos nas lutas. Pegando carona com os vizinhos, Marcos começou a treinar o Karatê com onze anos. Trabalho e estudo o fizeram parar por um longo tempo, mas, depois de formado, voltou a treinar até se tornar um exemplo de faixa preta e um professor. Hoje, casado há trinta anos com dois filhos e um neto, ele mora na cidade de São Sebastião (SP) e ministra as aulas de Karatê-Do no bairro Pontal da Cruz. O professor de Educação Física é praticante do esporte desde 1986, dando aulas de artes marciais há 17 anos.

O que é o Karatê-Do?

Marcos Alberto Fortes – O Karatê-Do é uma arte marcial pura e genuína. A nossa escola Shorin-Ryu é uma das escolas-mães do Karatê moderno junto com o Goju, que eram as escolas que praticamente iniciaram o Karatê no Japão. Significa o caminho das mãos vazias, porque a ilha de Okinawa onde ele se desenvolveu, antes do Japão dominar, era um reino independente, reino de Ryukyu. O Japão, uma vez, dominou esse reino e proibiu o uso de armas. Como eles não podiam portar armas, eles tinham que desenvolver técnicas para se defenderem. Foi assim que a arte marcial do Karatê começou, principalmente para se defender.

Quais são as virtudes ensinadas no Karatê?

A arte marcial dá ênfase nos valores humanos. Então, as virtudes que a gente tenta que os nossos atletas tenham é a humildade, a honestidade, a bondade, a compaixão, a tolerância. A gente tem no coração do nosso praticante que ele não esmoreça por qualquer dificuldade.

Quais são todas as faixas e a ordem delas?

Nós temos sete Kyus, os Kyus são as faixas. O sétimo é a faixa branca, depois vem a faixa amarela. Normalmente é branca, amarelo, laranja, azul, verde, roxa, marrom, que é o primeiro Kyu. Depois da marrom é a graduação superior, que é a faixa preta primeiro Dan. Aí, a escala vai até o décimo Dan.

Quantas pessoas começam a fazer essa arte marcial por ano, aproximadamente?

Na minha aula, geralmente a gente recebe em torno de 25 a 30 alunos novos por ano.

Quantos continuam até as últimas faixas?

São bem poucos os que perseveram, os que conseguem assimilar a filosofia, os treinamentos. Então, de um grupo que começa com 30 todo ano, chegam 2 a 5 alunos, que continuam até quase a faixa preta, e depois ficam menos ainda. A maioria dos nossos atletas para por problemas bons, a maioria deixa o Karatê por trabalho, por estudo, ou mudou de cidade. Aconteceu comigo e com muitos outros. Você estabiliza sua situação profissional, familiar, você acha o tempo e retorna.

O que esperam aprender ou fazer ao começarem as aulas?

Depende da faixa etária, as crianças vêm muito hoje influenciadas pelos videogames, pelos desenhos animados.

Atualmente, Marcos Alberto Fortes é um
dos principais professores de Karatê no
Litoral Norte
Qual é a filosofia ensinada pelo Karatê?

A filosofia do controle. Controlar o espírito agressor. Desenvolver a tolerância, a paciência, o esforço para se alcançar sucesso na vida, a concentração. É uma filosofia de vida que visa servir as pessoas, o carateca precisa, onde ele estiver, servir aos outros, ajudar aos outros. Ele não está ali por causa da habilidade dele.

Como os alunos novos reagem ao aprender uma filosofia de vida nas aulas de artes marciais?

Alguns estranham, e demoram a se adaptar. Quando entra no Dojo, existem regras de conduta e comportamento que devem ser seguidas ali e, de preferência, fora. As condutas de respeito ao próximo são imprescindíveis no Karatê. Eu vejo muito os pais procurarem o Karatê, porque ali ainda é uma última tábua de salvação, onde vão ser colocados limites. Ali no Dojo, a gente ainda tem essa condição de melhorar. Só que alguns, logicamente, não se adaptam.

O que significa se tornar faixa preta?

Esse é um trabalho que eu dou para os meus faixas marrom. Na verdade, até a faixa preta é como se fosse o fundamental da escola. É o ensino básico. Quando você chega na faixa preta, você entrou na faculdade. É o fim de uma jornada, de aprendizado básico, e o início de uma jornada de aprendizado mais profundo, superior. Ser um faixa preta significa também que é o faixa branca que nunca desistiu. Ele tinha tudo para desistir. Mas não é só isso, eu não posso fechar que o faixa preta é um faixa branca que não desistiu. Não basta só você conseguir tecnicamente chegar à faixa preta. Não agregou valores. Pra gente, é um faixa preta que não vai ser útil a ninguém. Não adianta eu ser faixa preta se eu não colocar em prática no meu dia a dia.

Quando se podem usar as técnicas do Karatê?

A gente orienta os alunos iniciantes que só podem e devem utilizar as técnicas do Karatê dentro do Dojo, no local de treinamento. Só em último dos casos que você vai usar as técnicas para, primeiro, se defender. Às vezes, é um coleguinha que está alterado, quer brigar com você... Se ele vier lhe agredir, você vai afastá-lo. Não vai usar a técnica com intensidade que você usaria no caso de vida ou morte. Aí é uma coisa muito pessoal. Numa situação de vida ou morte, como é que eu vou dizer para o atleta que ele não deve usar? A arte marcial foi feita pra você defender a sua vida, a da sua família.

Quais são as razões para o alto índice de violência atualmente?

São muitas... As injustiças sociais. Agora, o principal para mim é a falta de fé e amor no coração das pessoas. Essa violência toda hoje está muito atrelada ao fanatismo religioso e ideológico, político. E o terceiro ponto fundamental: A família. As famílias totalmente desestruturadas. Eu vejo que tudo isso, em uma panela de pressão, está virando um caos.

Quais atitudes no dia a dia deveriam ser repensadas? Por quê?

As atitudes de extremo egoísmo, de intolerância, de violência verbal ou física. Na verdade, todo mundo tinha que ter um tempo pra meditar, refletir. Eu acredito que isso ajuda o homem a se equilibrar.