Do lar à rua, as múltiplas faces da vulnerabilidade social

A complexidade da situação de rua no Brasil exige políticas públicas eficazes e o rompimento de preconceitos para garantir dignidade e pertencimento a quem vive à margem da sociedade


Por Yasmin Reis (*)



(Foto: Agência Brasil)


A população em situação de rua tem se tornado cada vez mais visível nas grandes e pequenas cidades brasileiras. São pessoas que, por diversos motivos, perderam o vínculo com uma moradia estável, com a família e, muitas vezes, com o próprio sentimento de pertencimento à sociedade.


Trata-se de um problema complexo, cujas causas são multifacetadas e envolvem desde fatores individuais até questões sociais e econômicas estruturais. Entre os principais motivos que levam uma pessoa a essa condição, destacam-se os conflitos familiares, a dependência química, o desemprego e os transtornos de saúde mental.


Discutir as causas da situação de rua e seus impactos sociais é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Compreender a rede de fatores que contribuem para a falta de moradia,  como pobreza, desemprego, violência familiar e dependência química; permite direcionar políticas públicas e ações eficazes no combate à exclusão social. Além disso, reconhecer as consequências dessa realidade, como a falta de acesso à saúde, a dificuldade de integração social e o aumento da vulnerabilidade, é essencial para desenvolver estratégias de inclusão e apoio a essa população.


A violência doméstica, o abandono, a negligência e outras formas de conflito familiar podem afastar indivíduos de seus lares, levando-os a buscar abrigo nas ruas. O uso abusivo de álcool e outras drogas está frequentemente associado a dificuldades financeiras, transtornos mentais e conflitos interpessoais, fatores que podem culminar na perda da moradia. A ausência de renda e o desemprego dificultam o acesso à alimentação, à habitação e a outros bens essenciais, agravando a situação de vulnerabilidade. Transtornos como depressão, ansiedade e esquizofrenia também impactam a capacidade das pessoas de trabalhar, manter vínculos sociais e cuidar de si mesmas, aumentando o risco de viver nas ruas. 


Soma-se a isso a desigualdade social e a falta de acesso à moradia digna e a serviços básicos, elementos estruturais que contribuem diretamente para o crescimento dessa população.


Leia mais: Vidas Invisíveis: perfil e desafios da população em situação de rua

Leia mais: A realidade das ruas e a indiferença que marginaliza

Leia mais: Redes de apoio: como instituições em Taubaté auxiliam pessoas em situação de rua


A situação de rua impõe impactos significativos na vida dessas pessoas. A exposição à violência, à fome e ao frio está entre as consequências mais graves. A ausência de abrigo e de recursos básicos aumenta a vulnerabilidade a doenças, traumas e limita o acesso a serviços de saúde e educação. Nas ruas, os indivíduos estão mais sujeitos à violência física e sexual, além de outras formas de agressão e discriminação. A invisibilidade social e a falta de proteção os tornam ainda mais suscetíveis a ataques e crimes. 


A escassez de alimentos adequados leva à fome e à desnutrição, comprometendo a saúde e o desenvolvimento físico. Já a exposição prolongada ao frio, especialmente no inverno, pode causar hipotermia, agravar doenças pré-existentes e afetar a saúde mental, contribuindo para quadros de depressão e ansiedade, reflexo do estresse constante da sobrevivência.


Essa realidade também gera impactos significativos para a sociedade, como a sobrecarga dos serviços públicos, a naturalização da desigualdade e os elevados custos sociais e econômicos. Pessoas em situação de rua enfrentam diversas barreiras para acessar serviços essenciais, como saúde, assistência social e moradia. A ausência desse suporte contribui para o agravamento de problemas de saúde, o aumento da violência e a intensificação da exclusão social.


Para mudar esse cenário, é necessário oferecer apoio e oportunidades reais para que essas pessoas possam reconstruir suas vidas, com foco em moradia, saúde, trabalho, educação e assistência social. Isso inclui a construção de uma rede de apoio que facilite o acesso a serviços essenciais, como alimentação, abrigo, cuidados de higiene, saúde e educação.


É fundamental fortalecer abrigos e centros de acolhimento, com equipes preparadas para atender às necessidades específicas de cada indivíduo. O apoio emocional e psicossocial, realizado por profissionais especializados em exclusão social e trauma, também é indispensável.



(Foto: Agência Brasil)


Além disso, é importante mobilizar a sociedade civil por meio de ações de voluntariado e doações, promovendo o suporte a abrigos e projetos sociais, e estimulando a conscientização sobre o preconceito e a discriminação enfrentados por pessoas em situação de rua. Por fim, é essencial elaborar e implementar políticas públicas que priorizem a inclusão social e a garantia de direitos dessa população.


Compreender as causas que levam alguém à situação de rua é o primeiro passo para enfrentá-las de forma efetiva e humana. Essa é uma realidade marcada por profundas desigualdades, exclusão social e pela ausência de políticas públicas eficazes. É necessário reconhecer que ninguém vai para as ruas por vontade própria — na maioria das vezes, essa condição é resultado de uma série de violências e negligências acumuladas ao longo da vida.


A realidade das pessoas em situação de rua nos desafia a olhar para além dos preconceitos e estigmas, reconhecendo a dignidade e os direitos de cada indivíduo. Enfrentar esse problema exige o compromisso conjunto da sociedade, do poder público e de cada um de nós, por meio de políticas inclusivas, apoio efetivo e, sobretudo, empatia. Só com uma mobilização coletiva e humanizada será possível romper o ciclo da exclusão, garantindo a todos o direito de viver com segurança, respeito e pertencimento.


(*) Sob supervisão e edição do Prof. Me. Caíque Toledo